O
século terceiro vê Roma em gravíssima crise. As relações entre Cristianismo e
império romano transformam-se, embora nem todos o percebam. A grande crise é
assim descrita pelo historiador grego Herodiano: «Jamais houve, nos duzentos
anos passados, um tão freqüente suceder-se de soberanos, nem tantas guerras
civis e contra os povos limítrofes, nem tantos movimentos de povos. Houve uma
quantidade incalculável de assaltos a cidades no interior do Império e em
muitos países bárbaros, de terremotos e pestilências, de reis e usurpadores.
Alguns deles exerceram o comando longamente, outros mantiveram o poder por
brevíssimo tempo. Algum deles, proclamado imperador e glorificado, permaneceu
um só dia e logo desapareceu».
O Império Romano estendera-se progressivamente com a conquista de novas
províncias. A conquista continuada permitira a exploração de sempre novas
vastíssimas terras (o Egito era o celeiro de Roma, a Espanha e as Gálias, a sua
vinha e o seu olival). Roma apossara-se de sempre novas minas (a Dácia tinha
sido conquistada pelas suas minas de ouro). As guerras de conquista tinham
providenciado multidões infinitas de escravos (prisioneiros de guerra),
mão-de-obra gratuita.
Em meados do século terceiro (por volta de 250) percebeu-se que a festa
acabara. A Leste, formara-se o poderoso império Sassânida, que fez duríssimos
ataques aos Romanos. Em 260 foram capturados o imperador Valeriano e todo o seu
exército de 70 mil homens, e devastadas as províncias do Leste. A peste acabou
com as legiões supérstites e espalhou-se por todo o Império. Ao Norte
formara-se um outro aglomerado de povos fortes: os Godos. Espalharam-se pela Mésia
e pela Dácia. O Imperador Décio e o seu exército tinham sido massacrados em
251. Os Godos desceram devastando do Norte até Esparta, Atenas, Ravena. Eram
terríveis os amontoados de destroços que deixavam. A maior parte das pessoas
cultas, que não puderam ser substituídas, perderam a vida ou tornaram-se
escravas. A vida regrediu ao estado primitivo e selvagem. A agricultura e o
comércio foram aniquilados.
Nesse tempo de grave incerteza cai a segurança garantida pelo Estado. Agora são
os gentios (=pagãos) que se tornam "irracionais", a confiar não mais
na ordem imperial mas na proteção das divindades mais misteriosas e estranhas.
Surge no Quirinal, em Roma, um templo à deusa egípcia Isis, o imperador
Heliogábalo impõe a adoração do deu Sol, o povo recorre a ritos mágicos para
manter a peste distante. Entretanto, mesmo no século terceiro dão-se anos de
terríveis perseguições contra os cristãos. Não mais por causa da sua
"irracionalidade" (num mar de gente que se entrega a ritos mágicos, o
cristianismo é agora o único sistema racional), mas em nome da renascida
limpeza étnica. Muitos imperadores, mesmo sendo bárbaros de nascimento, vêem no
retorno à unidade centralizada a única via de salvação. E decretam a extinção
dos cristãos, sempre mais numerosos, para lançar fora da etnia romana esse
"corpo estranho", que se apresenta sempre mais como uma nova etnia,
pronta a substituir aquela que já declina do império fundado nas armas, na
rapina, na violência.
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